Os últimos minutos do World Trade Center

Os últimos minutos do World Trade Center

Uma matéria do "The New York Times" que tive que traduzir.

O original está em:

http://www.nytimes.com/2002/05/26/nyregion/26WTC.html

A tradução foi publicada na seção Parabólica, do site Globonews.com

= = =

Esta é uma versão livre para o português de um artigo publicado em 2002-05-26 no New York Times com o título "Fighting to Live as the Towers Died", escrito por Jim Dwyer, Eric Lipton, Kevin Flynn, James Glanz e Ford Fessenden. Originalmente o texto foi publicado na web em oito partes, mas segue abaixo na íntegra:

= = =


Os últimos minutos do World Trade Center

Elas começaram como chamadas por ajuda, informação, direção. Rapidamente se transformaram em chamadas desesperadas, raivosas e às vezes amorosas. Elas agora são a lembrança das vozes dos homens e mulheres que estavam presos nos andares mais altos das torres gêmeas.

A partir de suas últimas palavras, uma terrível crônica dos 102 minutos finais do World Trade Center surgiu, obtida a partir de dezenas de conversas telefônicas e mensagens de email e voz. Estes relatos, juntamente com os testemunhos de várias das pessoas que escaparam, fornecem a primeira visão geral dos andares atingidos diretamente pelos aviões e dos andares acima.

Coletadas pelos repórteres do New York times, estas últimas palavras dão uma forma humana a esta terrível catástrofe pública: a crescente destruição que ia se processando nos 19 últimos andares da torre norte e nos 33 últimos andares da torre sul, em que houve severas perdas de vidas em 11 de setembro. Das 2.823 pessoas supostamente mortas no ataque a Nova York, pelo menos 1.946 delas, ou seja, 69%, foram mortas nestes andares superiores, segundo uma análise do NYT.

Trabalhadores de resgate não chegaram a se aproximar dessas pessoas. Fotógrafos não poderão registrar seus rostos. Se elas puderam ser vistas por alguns instantes, foi através de relances pelas janelas que ficavam a quase 400 metros de altura.

Como se fossem mensagens numa garrafa eletrônica deixadas por pessoas abandonadas em algum céu distante, estas últimas palavras narram um mundo que estava se destruindo. Um homem envia um email perguntando: "Alguma notícia lá de fora?", logo antes de ficar de pé sobre o parapeito do restaurante Windows of the World. Uma mulher relata que sua colega está batendo na válvula inútil de um sprinkler com seu sapato. Um marido calmamente lembra sua esposa sobre suas apólices de seguro, e lhe diz que ela e suas crianças significam o mundo para ele.

Nenhuma chamada individualmente descreve cenas que estavam se desenrolando a terríveis velocidades em muitos lugares. No entanto, tomadas em conjunto, estas palavras dos andares superiores oferecem não apenas uma ampla e assustadora visão das zonas devastadas, mas também a única amostra de atos de bravura, decência e graça num momento brutal.

Oito meses após os ataques, muito sobreviventes amigos e parentes daqueles que se foram estão reunindo suas lembranças, fitas e registros telefônicos, e 157 deles nos contaram sobre seus contatos para enriquecer este artigo. Cerca de 353 dos que pereceram tiveram a chance de alcançar pessoas fora das torres. Faladas ou escritas à hora da morte, são palavras íntimas e duradouras. O pesado custo emocional de torná-las públicas vale ser pago, dizem as famílias, em prol de um quadro claro daqueles minutos finais.

Muitos também têm esperança de que a história daquele dia seja expandida além dos memoriais erguidos ao inquestionável valor dos 343 bombeiros e 78 outros profissionais de resgate. É tempo, dizem eles, de registrar as experiências dos 2.400 civis que também morreram naquele dia. Iliana McGinnis, cujo marido Tom lhe telefonou do 92º andar da torre norte, disse: "Se eles puderem desvendar apenas mais uma peça de informação sobre o que aconteceu naqueles últimos minutos, eu a quero."

Alguns detalhes permanecem desconhecidos. Telefones funcionando eram escassos. A evidência física foi destruída. As conversas eram conduzidas sob terrível estresse e são lembradas em meio a um forte pesar. Mesmo assim, à medida que cada frágil trecho de informação se concatena com o próximo, vão se esclarecendo as condições nos andares mais altos.

As provas fortemente sugerem que 1.100 ou mais pessoas nas zonas de impacto ou acima delas sobreviveram aos impactos iniciais, mais ou menos 300 na torre sul e 800 na torre norte. Muitos deles continuavam vivos até o desabamento do prédio onde estavam.

Mesmo depois que o segundo avião atingiu a torre sul, um lance de escadas permaneceu aberto, coletando os últimos andares ao térreo. O NYT identificou 18 homens e mulheres que usaram estas escadas para escapar das zonas críticas. Ao mesmo tempo em que elas estavam evacuando o prédio, outras 200 pessoas estavam subindo estas escadas em direção ao telhado da torre, sem saber que teria sido possível descer direto até o chão e incorretamente assumindo que conseguiriam abrir a porta do telhado. "A crença de que elas tinham uma opção no topo do prédio lhes custou as vidas." -- disse Beverly Eckert, cujo marido, Sean Rooney, lhe telefonou após esta fútil tentativa.

Centenas ficaram presos na armadilha dos andares intocados pelos aviões. Apesar de os edifícios terem sobrevivido aos impactos iniciais, a deformação e o entortamento das estruturas causaram danos fatais. As escadarias estavam presas a paredes de fibra quebradas. Portas ficaram agarradas às suas molduras e dobradiças. Se tivessem mais tempo e ferramentas simples como pés-de-cabra, trabalhadores de resgate poderiam ter libertado pessoas que simplesmente não puderam chegar às escadas. Na torre norte, pelo menos 28 pessoas foram libertadas nos andares 86 e 89 por um pequeno grupo de trabalhadores do escritório da Port Authority que conseguiu abrir portas travadas. Estes salvadores espontâneos morreram.

Em ambas as torres, dezenas de pessoas perderam chances de escapar. Algumas deram uma última parada para fazer uma derradeira chamada telefônica; outras, para pegar uma bolsa esquecida; outras ainda, para desempenhar tarefas como livrar pessoas de elevadores, atender feridos e confortar os desorientados.

As crises tiveram inícios e finais e idênticos em ambas as torres, mas seguiram diferentes enredos. Pelo menos 37 pessoas, e provavelmente bem mais do que 50, puderam ser vistos pulando ou caindo da torre norte, ao passo que nenhuma foi vista caindo da torre sul, pelo que se pôde captar da coleção de vinte fitas de vídeo produzidas por amadores e profissionais posicionados nas ruas e edifícios próximos. Ambas as torres produziam volumes similares de fumaça e calor, mas na torre norte, cerca de três vezes mais pessoas estavam presas em metade do espaço. Muitos se dirigiram às janelas da torre norte em busca de ajuda. Na torre sul, as pessoas tinham mais oportunidades de se movimentar entre andares.

As zonas de impacto delimitaram fronteiras cruéis entre os que foram poupados e os que foram dizimados. Mesmo às margens dos impactos, as colisões foram devastadoras: a ponta da asa do segundo avião arrebentou o lobby da torre sul no 78º andar, instantaneamente matando dúzias de pessoas que esperavam pelos elevadores. Ao todo, cerca de 600 civis morreram na torre sul no nível de impacto do avião ou acima dele. Na torre norte, toda pessoa que se acreditava estar acima de 91º andar morreu: 1.344.

Quanto mais longe do impacto, mais as pessoas telefonavam. Na torre norte, bolsões de silêncio quase absoluto se estendiam quatro andares acima e um andar abaixo da zona de impacto. Surpreendente foi o fato de que, em ambas as torres, mesmo em andares diretamente atingidos pelos jatos, algumas poucas pessoas sobreviveram o suficiente para fazer chamadas telefônicas.

Para pôr estas mensagens fragmentadas em contexto, o NYT entrevistou membros das famílias, amigos e colegas daqueles que morreram, obtiveram os horários exatos das chamadas a partir das contas de celulares e dos registros do serviço 911, analisou 20 fitas de vídeo e ouviu 15 horas de gravações da polícia e dos bombeiros.

Foram entrevistadas também 25 pessoas que viram em primeira mão a destruição causada pelos aviões, pois elas escaparam da zona de impacto e dos andares acima delas na torre sul, e imediatamente abaixo na torre norte.

8:00 Torre Norte, 107º andar, Windows on the World, 2 horas e 28 minutos antes do desabamento

"Bom-dia, Srta. Thompson."

O cumprimento de Doris Eng era particularmente ensolarado, como o dia, à chegada de Liz Thompson para o café da manhã no alto do edifício mais alto da cidade. Talvez a Srta. Eng tivesse combinado seu humor ao clima daquela gloriosa manhã de setembro, com um céu de rico azul que preenchia cada janela. Ou talvez fosse a companhia.

Rostos familiares ocupavam muitas das mesas no Wild Blue, o anexo íntimo do Windows que a Srta. Eng ajudava a gerenciar, de acordo com duas pessoas que lá comeram naquela manhã. Como em qualquer lugar, aquela única sala capturava o clima de humanidade que permeava o Trade Center.

A Srta. Thompson, diretora-executiva do Lower Manhattan Cultural Council, estava comendo com Geoffrey Wharton, um executivo da Silverstein Properties, que há pouco tinha feito um leasing das torres. À mesa próxima sentava-se Michael Nestor, inspetor geral da Port Authority de Nova York e Nova Jersey, juntamente com um de seus investigadores, Richard Tierney.

Numa terceira mesa estavam seis corretores de ações, muitos dos quais eram freqüentadores todas as terças-feiras. A Srta. Eng tinha uma surpresa para um deles, Emeric Harvey. Na noite anterior, um dos gerentes do restaurante, Jules Roinnel, deu à Srta. Eng duas entradas, daquelas quase impossíveis de se conseguir, para o musical "The Producers". O Sr. Roinnel disse que pediu à Srta. Eng para entregá-las ao Sr. Harvey.

Sentado sozinho numa mesa próxima à janela, com vista para a estátua da liberdade, estava um cliente relativamente novo, Neil D. Levin, diretor-executivo da Port Authority. Ele nunca antes havia se juntado aos outros para o café da manhã. Mas sua secretária havia requisitado uma mesa com antecedência e agora lá estava ele à espera de um amigo banqueiro, conforme relatou a esposa do Sr. Levin, Christy Ferer.

De tempos em tempos, o garçom Jan Maciejewski passava pela sala, enchendo xícaras com café e anotando pedidos, lembra o Sr. Nestor. Maciejewski era um dos vários funcionários do restaurante trabalhando no 107º andar. A maioria dos 72 empregados do Windows estava no 106º andar, onde o Risk Waters Group estava promovendo uma conferência sobre tecnologia da informação.

87 pessoas já tinham chegado, incluindo altos executivos da Merrill Lynch e da UBS Warburg, de acordo com os patrocinadores da conferência. Muitos estavam saboreando fatias de salmão defumado e café nos salões do restaurante. Muitos dos exibidores já se dirigiam aos seus estandes, montados na suíte Horizon, logo ao final do corredor.

Uma foto tirada naquela manhã mostrava dois dos exibidores, Peter Alderman e William Kelly, vendedores da Bloomberg L.P., conversando com um colega ao lado de uma mesa que exibia uma apresentação de computador com múltiplas telas. Stuart Lee e Garth Feeney, dois vice-presidentes da Data Synapse, exibiam apresentações de sua companhia de software.

Lá embaixo no lobby das torres, 107 andares abaixo, uma assistente do Sr. Levin esperava por seu convidado para o café. Mas quando o convidado chegou, ele e a assistente do Sr. Levin tiveram a sorte de pegar o elevador errado, de modo que tiveram que voltar ao lobby para esperar pelo certo.

Lá em cima, Levin lia seu jornal. Nestor e Tierney estavam um tanto curiosos para ver com quem seu chefe e iria se encontrar para o café. No entanto, Nestor tinha uma reunião, de modo que se dirigiram para descer de elevador, cumprimentando o Sr. Levin quando passaram por sua mesa. Atrás deles vieram a Srta. Thompson e o Sr. Wharton. Nestor segurou a porta do elevador e eles entraram.

Então, as portas se fecharam e as últimas pessoas a deixarem o restaurante Windows on the World começaram sua descida. Eram 8h44m da manhã.

8:46 Torre Norte, 91º andar, American Bureau of Shipping, 1 hora e 42 minutos antes do desabamento

O impacto se deu às 8h46m26s. O vôo 11 da American Airlines, um Boeing 767 medindo 47,5m de envergadura, carregando 37.854 litros de combustível, estava se movendo a 756km/h, segundo estimativas dos investigadores federais. Àquela velocidade, ele percorreu os dois últimos quarteirões até a torre norte em 1,2 segundos.

O avião rasgou seu caminho através dos andares 94 até 98, diretamente nos escritórios da Marsh & McLennan Companies, retalhando e destruindo colunas de aço, paredes, fichários e mesas cheias de computadores. Seu combustível em chamas incinerou tudo que estava em seu caminho. O trem de pouso foi cuspido da face sul do prédio, indo parar na Rector Street, a cinco quarteirões de distância.

A apenas três andares abaixo da zona de impacto, nada havia se movido no escritório de Steve McIntyre. Nem o peso de papel com o formato de um barco a vela. Nem os retratos de família que estavam arrumados na estante. McIntyre estava diante de um computador que ainda estava ligado.

E então veio a chicotada.

Uma poderosa onda de choque rapidamente se irradiou para cima e para baixo da zona de impacto. A onda refletiu para o topo e para a base da torre, três ou quatro segundos num sentido e depois no contrário, sacudindo o edifício como se fosse um grande navio numa tempestade.

"Nós temos que sair fora daqui!", gritou Greg Shark, um engenheiro e arquiteto do American Bureau of Shipping, enquanto tentava se equilibrar do gingado da estrutura logo à entrada do escritório de McIntyre.

De algum modo, eles ainda estavam vivos. Só mais tarde puderam os dois homens perceber a estreita margem de sorte que lhes permitiu sobreviver. Em seus relatos da luta por encontrar uma saída, eles proporcionaram a visão de um território de fronteira, uma zona intransponível através da qual pessoas aprisionadas acima nunca passariam.

McIntyre, Shark e nove outros funcionários, todos ilesos, se acotovelaram para sair da área da recepção do A.B.S. no canto noroeste, e dobraram à esquerda em direção aos elevadores e escadarias do núcleo da torre.

McIntyre se lembra de tentar enxergar por uma escadaria escura e semidestruída, cheio de fumaça. Ele não ouvia nada, a não ser água descendo em cascata pelas escadas, como se tivesse encontrado um riacho murmurante num passeio pela montanha. A água quase certamente vinha de canos de sprinkler rompidos. Sem conseguir ver nem ouvir ninguém na escuridão fétida, ele olhou para cima.

A escadaria estava bloqueada por cima, não por fogo nem por aço estrutural, mas por imensos pedaços de gesso, usualmente chamado Sheetrock, que originalmente revestia a escadaria para protegê-la. Em grandes pedaços, este material formava como que uma rolha na escadaria, selando a passagem a partir do 92º andar para cima. Descendo as escadas, havia obstrução similar, porém menos formidável.

"Isso não é nada bom", lembra-se de ter dito o Sr. McIntyre.

Na ocasião, certamente ele não estava consciente disto, mas naquele momento ele estava numa fronteira crítica. Acima dele, ao longo de dezenove andares, havia 1.344 pessoas, muitas delas vivas, abaladas, ilesas e clamando por ajuda. Nenhuma delas sobreviveria.

Nos 90 andares abaixo, milhares de outros também estavam vivos, abalados, incólumes e chamando por socorro. Quase todos eles viveram para contar a história.

Por piores que fossem as condições em que estivesse a escadaria, as duas outras saídas de emergência estavam ainda piores, disse mais tarde McIntyre. Assim, ele voltou para a primeira escadaria, a noroeste do centro do prédio. Assim que entrou no primeiro vão, imediatamente desceu escorregando dois lances, por sobre de gesso imundo. Ainda sem se ferir, deu uma parada e notou que havia luzes mais abaixo. Ele se recorda de ter gritado para os outros: "É por aqui!" Com isto, seus colegas da A.B.S se juntaram a ele no êxodo do 91º.

Um andar acima deles, no 92º, os funcionários da Carr Futures estavam fazendo exatamente a mesma coisa que a turma da A.B.S. tinha feito: procurar loucamente por uma saída dali.

Mas eles não haviam percebido que estavam do lado errado dos escombros.

No 92º andar, Damian Meehan chegou aos trancos e barrancos a um telefone na Carr Futures e ligou para seu irmão Eugene, um bombeiro no Bronx. "A coisa está realmente feia por aqui - estamos sem elevadores", disse.

Eugene lhe disse para ir para a porta da frente e ver se havia fumaça lá. Ele ouviu seu irmão deixando o telefone na mesa e foi seguindo os sons que lhe chegavam até o ouvido. Havia gritos e comoção, mas não pânico.

Alguns minutos depois, Damian Meehan retornaria, informando que a entrada frontal estava cheia de fumaça. "Vá para as escadas", disse Eugene, "veja de onde está vindo a fumaça, e vá na outra direção."

E foi então que Eugene ouviu seu irmão Damian pela última vez. Até hoje ele tem dificuldade de se lembrar se o irmão havia dito "Nós temos que ir!" ou "Nós estamos indo!". Só se recorda que ele disse "nós".

9:00 Torre Norte, 106º andar, Windows on the World, 1h28m para o desabamento

"Que faremos? Que faremos?" - é o que dizia Doris Eng, a gerente do restaurante, enquanto falava ao telefone com o centro de comando dos bombeiros, que ficava no térreo. Apenas alguns minutos após o choque do avião, o restaurante começou a se encher com fumaça e ela se viu lutando para liderar as 170 pessoas que estavam sob seu comando.

Muitos dos que estavam naquela multidão ganhavam a vida provendo informações e os equipamentos que as transmitiam, eram especialistas em comunicações participando de uma conferência matinal no salão de baile. Entretanto, com a fumaça ficando cada vez mais grossa, as instalações sem energia e todos com quase nenhuma noção do que estava se passando, o restaurante foi aos poucos se transformando em uma zona de isolamento, onde as pessoas se acotovelavam em busca de fragmentos de notícias.

"Ligue na CNN", escreveu num email à sua esposa um dos cientistas de computação que participava da conferência, Stephen Tompsett, usando seu comunicador de mão BlackBerry <www.blackberry.net>. "Preciso de notícias atualizadas."

Vídeos produzidos por dois cinegrafistas amadores mostram que a fumaça se intensificou com terrível velocidade no topo do edifício, brotando mais grossa das frestas nas janelas do que dos andares mais próximos à área de impacto do avião. Pouco mais cedo, Rajesh Mirpuri ligou para sua companhia, Data Synapse, tossindo, e disse que não conseguia enxergar mais do que três metros, recordou-se depois seu chefe, Peter Lee. Peter Alderman, o vendedor da Bloomberg, também relatou sobre a fumaça, usando seu BlackBerry para enviar um email à sua irmã dizendo: "Estou assustado!"

A Srta. Eng e os funcionários do restaurante Windows, de acordo com o treinamento de emergência, instruíram as pessoas que estavam no 107º andar a descerem para o corredor do andar abaixo, próximo às escadas, onde utilizaram um telefone especial para chamar o centro de comando dos bombeiros. A política de emergência do edifício mandava evacuar imediatamente o andar que estivesse em chamas e também um andar acima. As pessoas mais distantes, como aquelas no Windows on the World, deveriam sair apenas quando instruídas pelo centro de comando, "ou quando as condições exigissem tal ação".

No entanto, as condições estavam rapidamente se deteriorando. Glenn Vogt, o gerente geral do restaurante, disse que 20 minutos após o choque do avião, sua assistente, Christine Olender, ligou para a casa dele. Atendeu sua esposa, disse Vogt, pois ele estava na rua do lado de fora do WTC. A Srta. Olender disse à esposa de Vogt que eles não tinham recebido nenhuma notícia nem instrução sobre como escapar dali. "O teto está caindo e o assoalho está se estufando para cima" disse ela.

Nos primeiros 20 minutos após o impacto, um helicóptero da polícia reportou-se à sua base informando que não iria pousar no teto do prédio. Mas mesmo assim, muitos ainda nutriam esperanças de ser socorridos por alguém, de algum jeito.

"Eu não posso ir para lugar nenhum porque eles nos disseram para não nos movermos" disse Ivhan Carpio, funcionário do Windows, numa mensagem que deixou na secretária eletrônica de sua prima. "Eu tenho que esperar pelos bombeiros."

Por sua vez, os bombeiros estavam dando o máximo de si para responder à altura. Nunca se havia visto em Nova York um incêndio de tais proporções, cinco andares brilhando em chamas em questão de segundos. Os comandantes dos bombeiros que estavam no térreo não tinham como saber se alguma das escadarias oferecia passagem. Com a maioria dos elevadores fora de operação, os bombeiros estavam carregando equipamentos pesados escada acima, lutando contra uma verdadeira maré de gente que descia para evacuar o prédio. Uma hora depois do choque do avião, eles só tinham conseguido chegar a 50 andares abaixo do Windows.

Lá no térreo, as autoridades recebiam chamadas dos andares superiores. "Não havia muito que pudéssemos fazer além de dizer àquelas pessoas que pegassem uma toalha molhada e que a mantivessem junto a seus rostos." disse Alan Reiss, antigo diretor do departamento WTC da Port Authority. Todavia, o avião havia danificado as tubulações que levavam água aos andares superiores. Maciejewski, o garçom, disse a sua esposa pelo celular que não conseguia obter água suficiente para molhar um farrapo que havia encontrado. Disse a ela que iria tentar pegar água nos vasos de flores.

A sala quase não tinha água e carecia também de ar, mas celulares e BlackBerries não faltavam. Graças a esses equipamentos e a algumas linhas telefônicas intactas, pelo menos 41 pessoas no restaurante conseguiram entrar em contato com alguém fora do prédio. Peter Mardikian, da Imagine Software, disse à sua esposa, Corine, que estava indo para o telhado e que isso não ia demorar muito, lembra-se ela. Outros esperavam por sua chance de usar um dos poucos telefones em funcionamento.

Garth Feeney conseguiu ligar para sua mãe, Judy, na Flórida. Ela se lembra de tê-lo atendido com um jovial "Alô". Mas seu filho foi logo dizendo que não estava para papo: "Estou no World Trade Center e o prédio foi atingido por um avião."

O jeito calmo da equipe não conseguia conter a tensão. Laurie Kane, cujo marido Howard era o contador do restaurante, disse que podia ouvir alguma gritaria logo que terminal a conversa final que tiveram: "Estamos encurralados!" Gabriela Waisman, uma das participantes da conferência, ligou para sua irmã dez vezes em 11 minutos, tentando manter a conexão a todo custo. Veronique Bowers, gerente de cobrança de crédito do restaurante, ficava dizendo o tempo todo a sua avó, Carrie Tillman, que o prédio tinha sido atingido por uma ambulância.

"Ela estava tão confusa," disse a Sra. Tillman.

9:01 Torre Norte, 104º andar, Cantor Fitzgerald, 1h27m para o desabamento.

Apenas dois andares abaixo do Windows, o desastre se aproximava de forma compassada, quase emudecendo a sensação de emergência. A sala de conferências do noroeste no 104º andar abrigava apenas um dos grandes grupos de pessoas nos cinco pavimentos ocupados pela Cantor Fitzgerald. Lá a fumaça não havia se tornado onipresente de forma tão rápida quanto no Windows. O impacto e os incêndios não tiveram poder de devastação imediata tão grande quanto tiveram nos andares abaixo, os da empresa Marsh & McLennan.

Na verdade, Andrew Rosenblum, um corretor de ações da Cantor, pensou que seria uma boa idéia acalmar as famílias. Com sua esposa, Jill, ouvindo ao telefone em sua residência em Rockville Centre, no estado de Nova York, ele solicitou aos que estavam na sala: "Dêem-me seus números de casa," recorda sua esposa. Várias pessoas passaram informar seus nomes e seus telefones.

À medida que a lista crescia, Rosenblum concluiu que 40 ou 50 colegas estavam naquela sala, livres da fumaça. Pediu então à sua mulher que ligasse para os maridos e esposas daqueles que informaram seus telefones, dizendo que estavam todos na sala de conferência e que estavam bem. Jill se recorda de ter escrevinhado os nomes e números num bloquinho amarelo que tinha na cozinha, enquanto via as torres pegando fogo em sua pequena TV, ligada que estava num cubículo próximo à porta dos fundos.

Logo em seguida ela distribuiu pedaços de papel com os números para alguns amigos que apareceram por lá. E começaram todos a ligar para o pessoal da lista, tranqüilizando as famílias.

O grupo de Andrew Rosenblum, incluindo Jimmy Smith, John Salamone e John Schwartz, estava sentado no lado leste da área de corretagem de títulos, em uma das áreas abertas, de acordo com John Sanacore, um dos integrantes do grupo, que por sorte não tinha ido trabalhar naquele dia. Era um local de onde se podia desfrutar de uma ampla vista do Empire State Building.

Do lado oposto à área em que estavam, outros corretores estavam reunidos, com vista para o Rio Hudson. [Quem se importava com a vista naquele momento, ora pipocas? - c.a.t.] John Gaudioso, que normalmente trabalhava naquela seção, mas que afortunadamente tinha tirado aquela manhã para jogar golfe, recorda que Ian Schneider costumava sentar-se à cabeceira de uma fileira de mesas, onde naquele instante, vários colegas estavam ocupando os telefones fixos para receber chamadas de seus entes queridos e de clientes preocupados, conforme relataram depois seis pessoas que com eles se comunicaram na ocasião. Já tendo vivenciado o atentado a bomba no mesmo prédio em 1993, disse Schneider por telefone à sua esposa Cheryl: "O prédio balançou como nunca antes."

Na área de negociação com ações, na parte sul do 104º andar, com vista para a Estátua da Liberdade [Nossa, que fixação por paisagens têm estes colegas escribas de Manhattan! - c.a.t.], havia um terceiro grupo. Stephen Cherry e Marc Zeplin acionaram um dispositivo em suas mesas que permitia comunicação interestadual com outros escritórios da Cantor espalhados em todo o país. "Alguém pode nos ouvir?, perguntava Cherry. Uma corretora trabalhando em Chicago ouviu a pergunta e conseguiu contatar um grupamento de bombeiros perto do WTC. Imediatamente retornou, informando a Stephen Cherry: "Eles sabem que vocês estão aí."

Mike Pelletier, um corretor de commodities no escritório da Cantor no 105º pavimento, conseguiu falar com sua esposa Sophie e depois contatou um amigo, que lhe informou que o choque do avião havia sido um ataque terrorista. Pelletier soltou um xingamento, e repassou a informação aos berros àqueles que estavam perto dele.

Lá no gramado de Jill Rosenblum continuavam os amigos a telefonar para as famílias da equipe da Cantor. Debbie Cohen era uma das amigas, e informava pelo telefone: "Alô? Você não me conhece, mas eu recebi o seu número de alguém que está no World Trade Center. Cerca de 50 deles estão numa sala de conferências no canto do prédio e eles dizem que estão bem neste momento."

9:02 Torre Sul, 98º andar, Aon Corporation, 57 minutos antes do desabamento

Aqueles que estavam na torre sul ainda eram apenas espectadores, mesmo que assustados. "Ei Beverly, aqui é o Sean,", disse Sean Rooney na mensagem que deixou para sua esposa Beverly Eckert na secretária eletrônica. "Houve uma explosão no World Trade One, que é outro prédio. Parece que um avião o atingiu. O prédio está pegando fogo lá pelo 90º andar. É... é horrível! Tchau."

Mesmo na torre sul, as pessoas podiam sentir o calor que emanava dos incêndios no edifício em frente, e podiam ver as pessoas se jogando dos andares mais altos. Neste ponto, muita gente da torre sul começou a deixar o prédio. No entanto, a equipe de manutenção predial desta torre anunciou que as pessoas deveriam permanecer onde estavam, julgando que para elas seria mais seguro estar dentro de um prédio intacto do que andar por uma rua onde estariam caindo escombros ardentes.

Aquela instrução iria mudar no exato momento em que Rooney, que trabalhava para a companhia de seguros Aon, estava deixando uma segunda mensagem para sua esposa, às 9h02m.

"Amor, aqui é o Sean de novo," disse. "Parece que nós vamos ter que ficar nesta torre por enquanto." E deu uma pausa para escutar um anúncio público que podia ser ouvido ao fundo na gravação. "Tudo bem, aqui está seguro," prosseguiu Rooney, "Mas..." - Neste ponto ele mais uma vez parou para dar atenção a um novo aviso, de que caso houvesse condições no andar de cada um, deveria iniciar-se uma evacuação com toda a calma e ordem. "Depois te ligo," disse Rooney, "Tchau."

Enquanto gravava estas palavras, o vôo 175 da United Airlines rasgava o céu, num rasante sobre o porto de Nova York.

9:02 Torre Sul, 81º andar, Fuji Bank, 57 minutos para o desabamento.

"Sim," disse Stanley Praimnath ao seu interlocutor que falava de Chicago, "estou bem." Ele finalmente tinha conseguido descer até o lobby da torre sul, estava a salvo. Mas um guarda de segurança lhe disse que deveria voltar para cima. E agora, mais uma vez estava ele sentado à sua mesa, no Fuji Bank. "Estou bem", repetiu.

Conforme mais tarde contaria sua história, aquelas foram suas últimas palavras antes que ele visse uma estranha forma cinzenta no horizonte. Era um avião, voando próximo à Estátua da Liberdade. O jato da United Airlines foi crescendo à sua vista, até que ele pôde ver a lista vermelha na fuselagem. Então, a aeronave se inclinou meio de lado, e foi vindo exatamente em sua direção. [Imaginem o camarada ter visto isso e ainda ter sobrevivido para contar a história, mesmo depois de ter estado a salvo lá embaixo no lobby e subir de volta para quase morrer no segundo impacto. - c.a.t.]

Era mais um avião.

"Ai meu Deus, daqui pra frente é com Você!" lembra-se Praimnath de ainda ter gritado, metendo-se rapidamente por baixo de sua mesa metálica.

Às 9h02m54s o nariz de um jato de linha arrebentou-se diretamente no andar do Sr. Praimnath, a cerca de 40m de sua mesa. Formou-se uma bola de fogo. Peças de aço e componentes de alumínio do avião se transformaram em projéteis incandescentes. Uma onda de choque arremessou computadores e mesas janelas afora e rompeu grossos feixes curvos de cabos elétricos. Neste momento a torre sul pareceu inclinar-se, balançando gradualmente em direção ao rio Hudson, ferozmente testando o esqueleto de aço da construção antes de voltar à vertical.

Ao longo de ambas as torres, as escadarias estavam restritamente agrupadas na estrutura, e na torre norte, elas foram imediatamente danificadas ou obstruídas pela explosão. Ao longo da zona de impacto na torre sul, nos andares 78 a 84, porém, as escadas foram construídas de forma a se desviar das máquinas dos elevadores. Assim, em vez de seguirem o núcleo do edifício, duas das escadarias que serviam a estes andares foram construídas mais próximas do perímetro. Uma delas, a do lado noroeste, sobreviveu. Uma reportagem de maio no jornal USA Today também sugeriu que essa escadaria que restou pode ter sido preservada pela maquinaria.

Foi esta escadaria que fez toda a diferença para Stanley Praimnath, que a abaixado sob sua mesa pôde ver uma peça brilhante de alumínio do avião encravada no que restou da porta de sua sala.

A aeronave, que se chocou inclinada com o prédio, arrebentou seis andares de uma vez. Os três pavimentos de cima eram o escritório da Euro Brokers, no 84º andar. Ali tinha sido aniquilada a maior parte das instalações da empresa. No entanto, mesmo ali no ponto crítico do impacto do avião, outras pessoas ficaram vivas: Robert Coll, Dave Vera, Ronald DiFrancesco e Kevin York, entre outros. Em poucos minutos, elas se dirigiram à escadaria mais próxima, liderados por Brian Clark, fiscal dos bombeiros do 84º andar, que lançou mão de sua lanterna e seu apito.

Um pó fino misturado a uma tênue fumaça preenchia a escadaria. À medida que se aproximavam do 81º andar, segundo Clark se recorda, eles encontraram um homem magrinho e uma mulher gorducha. "Vocês não podem ir para baixo," disse ela. "Vocês têm que subir. Tem muita fumaça e fogo lá embaixo."

Esta avaliação mudou tudo. Centenas de pessoas chegaram a conclusão similar, mas a fumaça e os escombros na escadaria na verdade eram menos um empecilho do que o próprio medo que as pessoas tinham destes obstáculos. Mais tarde ficou claro que esta escada era a única forma de sair do edifício, permitindo o acesso desde o topo até ao térreo na torre sul. Qualquer um que tivesse encontrado estas escadas cedo o suficiente poderia ter achado seu caminho para a liberdade.

Todavia, esta oportunidade aparentemente simples não pareceu assim tão clara para o conjunto de sobreviventes situados no 81º andar, momentos após o choque. Eles analisaram as alternativas, com Clark mirando sua lanterna para os rostos de quem o cercava, perguntando a cada um: "Pra cima ou pra baixo?" O debate foi interrompido por gritos que vinham de logo abaixo.

"Socorro, socorro!", se esgoelava Praimnath, "Estou preso aqui. Não vão embora!"

Sem qualquer discussão adicional, o grupo que estava nas escadas que se dividiu indo para sentidos opostos. De acordo com o que se lembra Clark, foram Coll, York e Vera que decidiram subir, junto com a gordona, o magricela e mais dois outros que ele conhecia da empresa Euro Brokers, mas que não pôde identificar. York e Coll engancharam os braços para ajudar a mulher: "Vamos lá, você vai conseguir. Estamos nisso juntos!"

Clark e DiFrancesco optaram por descer, indo ao encontro do homem que gritava por socorro. Praimnath viu o feixe de luz da lanterna e foi se arrastando em direção a ele, driblando mesas destruídas e se desviando de pedaços desabados do teto. Minutos antes, aquilo era o departamento de empréstimos do Fuji Bank, juntamente com o salão dos empregados e a sala dos computadores. Finalmente ele chegou a uma parede bem danificada, que o separava do homem que tinha a lanterna.

De ambos os lados, eles se puseram a rasgar a parede, até que um prego penetrou na mão de Praimnath. Ele o arrancou esfregando a mão numa superfície dura na escuridão. E finalmente os dois homens puderam ver um ao outro, mas ainda estavam separados.

"Você precisa pular," disse Clark para Praimnath, cuja mão e perna esquerdos estavam agora sangrando. "Não tem outro jeito!"

Quando Praimnath pulou, Clark ajudou a impulsioná-lo por sobre o obstáculo. Depois correram para escadaria e foram diretamente para baixo. O revestimento das paredes estava espalhado pelos degraus. Chamas brotavam das rachaduras existentes nas paredes da escadaria. Água de vários canos rompidos cascateava degraus abaixo, formando uma lama traiçoeira.

Eles conseguiram ultrapassar o ponto densamente esfumaçado que a mulher tinha avisado. Talvez as correntes de ar tivessem mudado de direção, ou talvez a fumaça nunca tivesse sido tão forte assim como ela disse. Fosse como fosse, as escadas estavam liberadas e assim permaneceriam por até 30 minutos depois que a torre sul foi atingida.

Neste meio tempo, DiFrancesco fez um desvio em sua busca por ar, subindo cerca de dez andares, onde voltou a encontrar o primeiro grupo que tinha se dirigido para cima. Eles não conseguiam sair das escadas, pois as portas lá em cima não se abriam. Exaustos, e em meio a uma grossa fumaça, as pessoas foram se deitando, incluindo DiFrancesco. "Todos os outros estavam começando a dormir," disse ele. Então, lembra-se, ele se sentou e pensou: "Tenho que ver minha mulher e minhas crianças novamente." E desceu correndo escadas abaixo.

9h05m Torre Sul, 78º andar, elevador do Sky Lobby, 54 minutos para o desabamento.

Mary Jos não podia dizer ao certo por quanto tempo ela ficou ali deitada, inconsciente, no chão do lobby, do lado de fora do elevador expresso. Sua primeira lembrança de movimento foi quando ela sentiu um terrível calor em suas costas e em seu rosto. Pelo que se recorda agora, ela chegou a cogitar naquele momento que ela mesma estava em chamas. Instintivamente, pôs-se a rolar para abafar o fogo. Chegou a ver labaredas no centro da sala e nos poços dos elevadores.

Aquilo era suficientemente aterrorizante. Então, por baixo da grossa fumaça preta e através de nuvens de gesso pulverizado, ela gradualmente notou algo pior. O lobby do 78º andar, que minutos antes estava cheio de funcionários de escritório confusos se deveriam deixar o prédio ou voltar ao trabalho, estava agora repleto de corpos imóveis.

O teto, as paredes, as janelas, o quiosque de informação e até o mármore que adornava os elevadores, tudo estava agora em pedaços, depois que o segundo avião seqüestrado mergulhou sua asa esquerda no 78º andar.

Testemunhas afirmam que, em um único instante, foram surpreendidas por uma luz brilhante, um estouro de ar quente e uma onda de choque que se abalou sobre tudo. Caída em meio a um silêncio mortal, queimada e sangrando, Mary Jos tinha um único pensamento: seu marido. "Eu não vou morrer," disse ela, lembrando-se depois de suas próprias palavras.

Nos 16 minutos entre os ataques, aqueles que estavam na torre sul mal tiveram tempo para absorver os horrores que podiam em ver e decidir o que fazer. Mapeando suas escolhas de movimentos é possível ver a geografia da vida e da morte.

Antes do segundo impacto, segundo os sobreviventes, era um tanto estranho o clima entre as pessoas no Sky Lobby: havia um certo alívio diante dos anúncios de que seu edifício era um lugar mais seguro do que as ruas, e ao mesmo tempo havia um certo receio de que isso não fosse verdade. Nestes momentos críticos, as pessoas ficavam inquietas, tentando chegar a uma decisão. Será que deveriam permanecer em seus postos de trabalho aguardando a abertura do mercado, ou descer até o térreo para tomar um cafezinho? Na empresa Keefe, Bruyette & Woods, quase todos os funcionários deixaram o escritório e sobreviveram. Por outro lado, quase todos os corretores de ações ficaram esperando a abertura da Bolsa e morreram.

Um deles, Stephen Mulderry, conseguiu falar com seu irmão Peter e descreveu as labaredas que podia ver na torre norte a partir de sua janela. Ainda neste momento, vieram informações da gerência do prédio de que a torre sul estava "segura". E interrompeu sua derradeira conversa com o irmão por que o outro telefone, do tipo sem campainha, tinha suas luzes piscando, aparentemente indicando que o mercado estava para abrir. "Tenho que desligar", lembra-se Peter de ter ouvido seu irmão dizer, em suas últimas palavras.

Nos momentos antes do segundo impacto, todo mundo no 78º andar estava indeciso quanto a subir ou descer. Naqueles instantes, Kelly Reyher, que trabalhava no 100º andar na Aon Corporation, tomou um elevador que subia, pois queria pegar seu computador de mão Palm Pilot, imaginando que ainda ia demorar até que pudesse retornar ao seu escritório. Judy Wein e Gigi Singer, ambas também da Aon, debatiam sobre se deveriam voltar e pegar suas agendas em sua sala no 103º. Mas Howard L. Kestenbaum, seu colega de trabalho, disse-lhes para esquecer as agendas pois ele lhes daria uma carona para casa.

Havia até um certo tom de humor, pois alguns funcionários comentavam nervosamente sobre suas "pessoas" queridas, a quem estavam saindo para rever, com certa pressa. "Tenho um cavalo e dois gatos", brincou Karen E. Hagerty, 34, ao sair do elevador meio empurrada pelos outros, também apressados.

No instante do impacto do segundo avião, aquele saguão movimentado -- testemunhas estimam que eram entre 50 e 200 pessoas -- tornou-se silencioso, e escuro, quase sem vida. Para alguns poucos, a sobrevivência se deu apenas por terem instintivamente se desviado para um pequeno quartinho. A morte pode ter vindo pelo simples ato de alguém não ter querido forçar a entrada em um elevador cheio.

Quando a Srta. Wein voltou a si, tinha que se preocupar com seu corpo machucado: seu braço direito estava quebrado, três costelas rachadas e seu pulmão direito perfurado. Em outras palavras, ela teve sorte. Todos em volta dela eram pessoas com horríveis ferimentos, mortos ou quase. Ela chamou por seu chefe, Kestenbaum. Mas quando o encontrou, ele estava sem expressão, imóvel, em silêncio. A Srta. Hagerty, aquela que brincou sobre os gatos que tinha em casa, não mostrava sinais de vida quando um colega, Ed Nicholls, a viu. E Richard Gabrielle, outro colega da Aon, estava como que espetado ao assoalho, suas pernas aparentemente quebradas pelo mármore que caiu sobre elas.

Judy Wein tentou mover a pedra, mas Richard gritou de dor, disse ela, pedindo que parasse.

Gradualmente, aqueles que conseguiam, começaram a se mover. Judy encontrou dois colegas que aparentemente não tinham ferimentos graves, Vijayashanker Paramsothy e a Srta. Singer. Kelly Reyher, que estava subindo para pegar seu Palm Pilot, havia conseguido forçar a abertura das portas do elevador com seus braços e sua maleta. Saiu se esgueirando da cabine em chamas e viu a Sra. Donna Spira a uns 15m de distância. Seu braço estava fraturado, seu cabelo queimado, mas ela podia andar.

Um misterioso homem apareceu neste ponto, com o nariz e a boca cobertos por um lenço vermelho. Ele estava à procura de um extintor de incêndio. Conforme se recorda Judy Wein, ele apontou para as escadas e fez um anúncio que salvou muitas vidas: "Todos que conseguirem andar, levantem e andem AGORA! Qualquer um que ache que pode ajudar um outro, pegue alguém que precise de uma força e vá direto para baixo".

Em grupos de dois e três, os sobreviventes se dirigiram com muito custo para as escadas. Alguns lances abaixo se depararam com escombros bloqueando a passagem, deixando apenas um pequeno buraco por onde se enfiariam.

A poucos minutos atrás deste grupo estava Ling Young, que também havia sobrevivido ao impacto no Sky Lobby. Também ela disse ter sido incentivada pelo homem do lenço vermelho, tendo ouvido-o gritar: "É por ali, as escadas ficam por ali!" E levou-a a descer as escadas. Ling só depois notou que ele estava carregando uma outra mulher nas costas. Assim que desceram até um ponto em que o ar estava mais respirável, o homem botou a mulher de pé e voltou para cima.

Outros nunca chegaram a conseguir deixar a torre.

Os que escaparam disseram que o Sr. Paramsothy, que estava apenas com arranhões, ficou para trás. A Srta. Young disse que Sankara Velamuri e Diane Urban, colegas da Sra. Mary Jos no Departamento de Taxas e Finanças, tentou ajudar dois ou mais amigos seriamente feridos, Dianne Gladstone e Yeshavant Tembe, ambos também funcionários do Estado. Mas infelizmente todas estas cinco pessoas iriam morrer.

Entre as dezenas de pessoas que estavam esperando no Sky Lobby quando o segundo avião atingiu a torre, sabe-se que 12 delas sobreviveram.

9h35m Torre Norte, 104º andar, Fitzgerald; 106º andar, Windows on the World; 53 minutos para o desabamento.

Tão urgente era a falta de ar, que as pessoas se empilhavam umas sobre as outras, às vezes quatro ou cinco, em quase todas as janelas, algumas com o corpo para fora do prédio da cintura para cima, a mais de 400m de altura.

Estavam num terrível lugar.

Em outro local, dois homens, um deles sem camisa, estavam de pé em parapeitos diferentes, inclinando tanto seus corpos para fora que podiam até enxergar além de uma coluna que se interpunha entre eles, de forma que podiam ver uma ao outro, segundo revelou mais tarde uma análise de fotografias e vídeos.

No 103º andar, um homem ficava olhando para fora de uma janela quebrada, mirando o noroeste, agarrado ao que restou de uma janela com uma das mãos. Seu outro braço estava envolvendo uma mulher, aparentemente tentando impedi-la de cair lá de cima.

Atrás das janelas ainda intactas, juntaram-se os desesperados. Segundo um oficial de polícia que estava num helicóptero, por cerca de cinco andares abaixo do topo, havia umas 50 pessoas com seus rostos pressionados contra o vidro das janelas, tentando respirar.

Agora já não havia mais dúvida. O escritório da Cantor Fitzgerald, e logo acima dele, o restaurante Windows on the World, se transformaram no ponto de referência deste momento maldito. Cerca de 900 pessoas iriam morrer entre os andares 101 e 107.

No restaurante, pelo menos 70 pessoas se aglomeravam grudadas ao vidro das janelas no 106º andar, de acordo com relatos que ainda conseguiram fazer para seus parentes e colegas que não tinham ido trabalhar naquele dia. "Todos os lugares fora daqui estão cheios de fumaça," escreveu num email Stuart Lee, um vice-presidente da Data Synapse, em mensagem enviada ao seu escritório no bairro Greenwich Village. E continuou: "No momento está havendo uma discussão sobre se devemos ou não quebrar uma janela, mas até agora chegamos a um consenso de que não devemos fazê-lo."

Logo depois, porém, dezenas de pessoas podiam ser vistas através dos vidros quebrados ao longo da face oeste do restaurante. O Sr. Vogt, gerente geral do Windows, disse que podia vê-los lá do chão, como silhuetas contra a fumaça cinzenta que saía da janela de seu próprio escritório e de outros.

A esta altura, conforme demonstram as fitas de vídeo, os incêndios estavam se intensificando nos andares do impacto, projetando-se até a face norte da torre.

Na sala de conferência noroeste no 104º andar, Andrew Rosenblum e 50 outras pessoas temporariamente haviam conseguido evitar a fumaça e o calor usando seus paletós para obstruir qualquer buraco fumacento. "Arremessamos alguns computadores pelas janelas para fazer entrar algum ar," disse Rosenblum ao seu parceiro de golfe, Barry Kornblum.

Mas não havia como se esconder.

Quando as pessoas começaram a cair dos andares acima dos da sala de conferência, Rosenblum perdeu sua sobrenatural calma, lembra-se Jill, sua esposa. No meio de sua conversa com ela, sem nenhuma elaboração, ele de repente exclamou: "Ai, meu Deus!"

9h38m, Torre Sul, 97º andar, Fiduciary Trust; 93º andar, Aon Corporation; 21 minutos para o desabamento

"Ed, tome cuidado!" gritou Alayne Gentul, diretora de recursos humanos da Fiduciary Trust, quando Edgar Emery escorregou de cima da mesa em que estava de pé no 97º andar da torre sul, cada vez mais cheio de fumaça e quente.

Edgar, um dos colegas de trabalho de Alayne, vinha tentando usar seu blazer para obstruir um duto de ventilação de onde estava saindo fumaça. Para evacuar os funcionários da Fiduciary que trabalhavam neste andar, Edgar e Alayne haviam subido 7 andares a partir de seus próprios escritórios.

E agora os dois, juntamente com os seis ou sete que estavam tentando salvar, estavam em séria encrenca.

Enquanto Alayne Gentul falava com seu marido ao telefone -- ele podia ouvir mais ou menos o que estava acontecendo -- Edgar Emery se levantou e abriu seu casaco por sobre a abertura. Em seguida, bateu com um sapato na ampola do sprinkler, na esperança de iniciar um aguaceiro.

"Os sprinklers não estão funcionando," disse Alayne a seu marido, Jack Gentul, com quem falava em seu escritório no Instituto de Tecnologia de Nova Jersey em Newark, onde é reitor. Ninguém sabia que o avião havia rompido os tubos de água.

"Nós não sabemos se devemos ficar ou sair," disse Alayne a seu marido. "Não quero descer e encontrar um incêndio," disse ela.

Entre os que, sem saber, já estavam condenados à morte, os telefonemas, mensagens e testemunhos deixam claro que havia muitas pessoas que se colocaram conscientemente em risco ao parar para dar uma ajuda a colegas ou mesmo a estranhos. Outros agiram com grande ternura quando tudo mais estava perdido.

Alayne e Edgar da Fiduciary, cujos escritórios iam do 90º ao 97º andares, tinham feito suas próprias decisões fatídicas tentando ajudar outros.

Quando o primeiro avião atingiu as torres, a bola de fogo se projetou na fachada oeste da torre sul, exatamente onde ficava o escritório de Edgar. "Senti o calor no meu rosto," disse Anne Foodim, uma funcionária de recursos humanos que trabalhava perto.

Conhecido por sua tranqüilidade em momentos de crise, Edgar Emery tratava de fazer as pessoas saírem dali: "Vamos, vamos lá!", disse ele, ajudando cinco funcionários a ir para as escadas, incluindo Anne, que mais tarde relatou esses eventos. Eles desceram doze andares, chegando ao 78º e ao elevador expresso, com Emery lhes dando força e incentivo.

"Se você é capaz de encarar aquela quimioterapia, então você é capaz de descer esses degraus," disse Emery à cansadíssima Anne Foodim, que tinha acabado de terminar uma sessão para tratamento de câncer. Quando finalmente eles chegaram a um elevador apinhado de gente no 78º andar, Emery fez questão de se certificar que todos haviam embarcado na cabine. Empurrou o ombro de Anne e deixou a porta se fechar, voltando para cima para se juntar novamente a Alayne Gentul.

Tal como Emery, Alayne conseguiu liderar um grupo de fuga antes do impacto da segunda aeronave. Uma recepcionista, Mona Dunn, viu Alayne no 90º pavimento, onde funcionários estavam debatendo sobre se deviam ficar ou sair. Alayne Gentul instantaneamente resolveu a questão. "Desçam e desçam em ordem," disse ela, indicando o acesso às escadas.

"Era como se fosse uma professora dizendo: podem ir, está tudo bem," lembrou-se depois Mona Dunn.

Juntos, Alayne e Emery foram ajudar na evacuação de seis pessoas no 97º andar que estavam trabalhando numa operação de backup dos computadores, disse Alayne a seu marido.

Emery estava à procura das escadas no 97º, quando conseguiu alcançar sua esposa, Elizabeth, via celular. A última coisa que ela ouviu antes da ligação cair foi a voz de Alayne Gentul gritando bem perto de onde estava Ed Emery: "Onde estão as escadas? Onde estão as escadas?"

Uma outra chamada telefônica estava em curso ali perto. Edmund McNally, diretor de tecnologia da Fiduciary, ligou para sua esposa, Liz, quando chão começou a ceder. McNally apressadamente instruiu sua mulher sobre os detalhes das apólices de seguro e dos bônus funcionais que tinha. "Ele me disse que eu significava o mundo para ele e que me amava," disse a Sra. McNally, e em seguida trocaram o que acreditavam ser seu último adeus.

Então, o telefone da Sra. McNally novamente tocou. Seu marido, meio sem jeito, informou de que tinha feito reservas para eles para uma viagem a Roma por ocasião do 40º aniversário dela. Ela ainda se lembra dele dizendo: "Liz, e você vai ter que cancelar isso."

No 93º andar, Gregory Milanowycz, 25, um corretor de seguros da Aon, encorajava outros a fugir, alguns dos quais sobreviveram. Mas ele mesmo havia ficado para trás, após ouvir o anúncio. "Porque fui dar ouvidos a eles, não devia ter feito isso," resmungou depois de ter falado por telefone com seu pai, Joseph Milanowycz. Agora estava encurralado. Pediu a seu pai para perguntar aos bombeiros o que ele e trinta outras pessoas deveriam fazer. Seu pai disse que conseguiu fazer chegar a seu filho a instrução para que descessem o quanto pudessem, pois os bombeiros estavam trabalhando para subir. Então, diz ele, ouviu seu filho exclamando para os outros: "Eles estão vindo! Meu pai está no telefone com eles. Eles estão vindo. Todo mundo vai conseguir descer até lá embaixo."

Mesmo quando a situação já não deixava mais qualquer esperança, as pessoas presas lá em cima ainda estavam cuidando umas das outras. No 87º andar, um grupo de vinte pessoas da Keefe, Bruyette & Woods se refugiou numa sala de conferência pertencente ao New York State Department of Taxation and Finance. Durante os minutos finais, Eric Thorpe conseguiu fazer um chamado para sua esposa, Linda Perry Thorpe, que estava esperando por notícias dele no apartamento de seus vizinhos. Ninguém falou sobre a torre. Em vez disso, a Sra. Thorpe e os vizinhos ouviram apenas os ruídos do ambiente...

"Estou ouvindo tudo que está acontecendo lá," disse a Sra. Thorpe, "incluindo som de gente ofegante." Alguns pareciam calmos, segundo ela, mas outros se desesperavam: "Cadê o extintor de incêndio?", outro dizia: "Já o tacaram pela janela". Depois ouvir alguém perguntando: "Tem alguém inconsciente?"

"Teve um cara que ficou maluco, gritando. Eu não entendia nada do que ele dizia. Ele estava perdido," disse a Sra. Thorpe. "E depois uma outra pessoa ficou acalmando o sujeito, dizendo que estava tudo ok."

9:45, Torre Sul, 105º andar, 14 minutos para o desabamento.

Minutos após o segundo avião ter atingido a torre sul, Roko Camaj ligou para casa para relatar que havia uma multidão perto do topo do prédio. É o que conta o filho de Roko, Vinny Camaj. Roko disse a sua esposa: "Estou aqui no 105º andar e tem cerca de 200 pessoas aqui."

A promessa de refúgio na cobertura no topo da torre parecia tão lógica, tão irresistível, que hordas de desesperados apostaram em subir as escadas. Mas eram becos sem saída.

Camaj, um lavador de janelas que já havia até sido personagem de um livro infantil, tinha a chave para o telhado, disse depois seu filho. No entanto, aquela chave sozinha não poderia abrir a porta: uma trava tinha que ser acionada pela equipe de segurança num posto de comando no 22º andar. E o tal posto havia sido destruído e evacuado.

O telhado parecia ser a escolha óbvia -- e a única que restava -- para as pessoas nos andares superiores. Um helicóptero da polícia tinha efetuado uma operação de evacuação das pessoas no teto da torre norte em fevereiro de 1993, após a explosão de uma bomba terrorista no subsolo. Por uma série de razões, entretanto, a Port Authority em acordo com os bombeiros, passou a não mais apoiar o uso de helicópteros como parte de seu plano de evacuação. Os comandantes da polícia afastaram a possibilidade de um resgate aéreo no teto do prédio naquela manhã.

A despeito de qual tenha sido a sabedoria daquela decisão, ela foi um choque para as muitas pessoas que se viram encurraladas nas torres, segundo seus familiares e de acordo com os registros de chamadas ao número de emergência 911. Apenas uns poucos se deram conta de que a escadaria A poderia permitir a descida em segurança, e aquela informação nunca chegou a ser repetida de volta para os que estavam em cima, nem através dos que conseguiram escapar, nem por intermédio das autoridades. Frank Doyle, um corretor da Keefe, Bruyette & Woods, telefonou para sua esposa, Kimmy Chedell, para lembrá-la de seu amor por ela e por suas crianças. Ela se lembra de tê-lo ouvido dizer também: "Fui até o telhado mas as portas estavam trancadas. Você precisa ligar para o 911 e dizer para eles que nós estamos encurralados."

O 105º andar era o ponto final para muitos daqueles que subiram em direção à cobertura, uma multidão composta em sua maioria por funcionários da Aon. Às 9h27m, um homem ligou para o 911 e disse que um grupo estava na sala de conferências norte no 105º. Às 9h32m, um outro homem ligou para 911 pedindo que alguém abrisse as portas para a cobertura. Às 9h38m, Kevin Cosgrove, um fiscal de incêndio da Aon, ligou também para o 911 e em seguida telefonou para seu irmão.

Sean Rooney ligou para Beverly Eckert. Eles tinham se conhecido num baile de colégio na cidade de Buffalo quando tinham ambos 16 anos. Acabavam de comemorar juntos seus aniversários de 50 anos.

Sean tinha tentado descer, mas não teve sucesso. Decidiu então subir os cerca de trinta andares que o separavam da cobertura, que na verdade estava trancada. E agora ele queria arranjar um jeito de sair, e para tanto, pediu que sua esposa descrevesse a exata localização do incêndio a partir das imagens que via na televisão. Ele não conseguia entender por que o telhado estava trancado, disse ela. Ela o incentivou a tentar novamente enquanto ela discava para 911 usando outra linha. Ele abandonou o telefone, retornando minutos depois, dizendo que a porta nem se mexia, apesar de tê-la golpeado várias vezes.

"Ele estava preocupado com as chamas," lembra-se a Sra. Eckert. "Eu ficava dizendo a ele que o fogo não estava perto. Mas ele dizia que as janelas estavam quentes e que estava ficando cada vez mais difícil respirar."

Os tetos dos andares estavam cedendo, bem como os pisos. As chamadas telefônicas estavam sendo interrompidas. Ele estava sozinho numa sala que estava se enchendo de fumaça. Eles se despediram.

"Ele estava me dizendo que me amava. E depois dava para ouvir uma explosão bem alta."

10h00m, torre Norte, 92º andar, Carr Futures, 28 minutos para o desmoronamento.

"Mãe!", perguntou Jeffrey Nussbaum, "O que foi essa explosão?"

Trinta e dois quilômetros distante das torres, em Oceanside, no estado de Nova York, Arline Nussbaum podia ver da televisão o que seu filho não podia ver a 50m de distância. Ela se lembra de suas últimas palavras: "A outra torre acabou de desabar," disse a Sra. Nussbaum. "Ó meu Deus," disse seu filho, "Eu te amo, mãe."

E o telefone ficou mudo.

A torre norte, que havia sido atingida 16 minutos antes da torre sul, ainda estava de pé. Estava morrendo, mais devagar, mas certamente estava. Os telefonemas estavam cessando. O número de pessoas caindo das janelas começou a aumentar.

Naquela manhã o escritório da Carr Futures no 92º pavimento estava anormalmente ocupado. Um total de 68 pessoas estava naquele andar na ocasião, 67 delas ligadas à Carr.

Cerca de 24 corretores da empresa controladora da Carr tinham sido chamados para uma reunião especial às 8 da manhã. Quando o edifício se entortou para trás e para frente como uma antena de automóvel, várias portas se travaram, aprisionando muita gente na sala de conferências.

Os funcionários da Carr que sobraram, cerca de 40, foram todos para um grande espaço vazio e ainda não ocupado no lado oeste. Jeffrey Nussbaum ligou para sua mãe e dividiu seu celular com Andy Friedman. Ao todo, os familiares do pessoal da Carr contabilizaram 31 chamadas das pessoas que perderam, de acordo com a Sra. Joan Dincuff, cujo filho Christopher faleceu naquela manhã.

A empresa Carr estava dois andares abaixo do impacto, e todos lá haviam sobrevivido a ele, mas mesmo assim não puderam se salvar. De acordo com os vídeos, entre 10h05m e 10h25m, o fogo se alastrou para oeste atravessando a face norte do 92º andar e atingindo o refúgio que ficava no lado oeste da torre.

Às 10h18m, Tom McGinnis, um dos corretores convocados para a tal reunião especial, conseguiu falar com sua esposa, Iliana. As palavras daquela conversa estão gravadas na memória dela.

"As coisas aqui estão realmente, realmente más," disse ele.

"Eu sei," respondeu Ilana McGinnis, que nutria a esperança de que a famigerada reunião tivesse terminado antes do choque do avião. "Isso é mau para o país: parece a Terceira Guerra Mundial".

Mas alguma coisa no tom de voz de seu marido assustou Ilana, e ela perguntou: "Você está bem? Sim ou não?" E Tom respondeu: "Nós estamos no 92º andar, numa sala de onde não podemos sair."

"Quem é que está aí com você?" perguntou ela. E Tom McGinnis mencionou três velhos amigos: Joey Holland, Brendan Dolan e Elkin Yuen.

"Eu te amo", disse Tom. "Tome conta de Caitlin". Ilana não estava preparada para ouvir um adeus, e disse ainda: "Não perca sua calma. Vocês são tão durões, e você é tão esperto, que eu tenho certeza que vocês vão sair dessa."

"Você não está entendendo, amor," replicou Tom. "Tem gente se jogando dos andares aqui em cima da gente."

Eram 10h25m. O incêndio varria o lado oeste do 92º andar. Pessoas caíam das janelas. Tom McGinnis novamente disse à sua esposa que a amava e também a sua filhinha Caitlin.

"Não desligue!", implorou Ilana. Mas Tom respondeu: "Eu tenho que me deitar no chão." E nesse momento, a ligação telefônica se foi.

Eram 10h26m, dois minutos antes de a torre ruir. E o World Trade Center se fez silencioso.

(fim)

= = =

Devo dizer que não foi nada fácil traduzir este longo artigo, nem tanto pelo inglês, mas mais pelo peso emocional do texto, que é terrível. Obrigado aos que pacientemente acompanharam a publicação das oito partes da tradução na Parabólica do Globonews.Com e nossos parabéns aos colegas do New York Times pelo brilhante trabalho.

- c.a.t.


http://www.nytimes.com/2002/05/26/nyregion/26WTC.html

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

FINALMENTE!

Veja neste minivídeo que entrega cuidadosa! Este verdadeiro ANIMAL da FedEx joga por cima da...